Eu sei, mais um texto sobre os tantos textos que já rolam por aí (me refiro a conversa que surgiu com um artigo da Fast Company e posts sobre “a morte do design”, links no final do texto), até criaram um site só com esses textos. Mas eu preciso dar o meu pitaco, afinal é por isso que tenho uma newsletter 😎.
Esse texto ficou um pouco mais longo que o normal, se eu tivesse que resumir tudo seria o seguinte: O verdadeiro superpoder do designer está em visualizar ideias e conceitos abstratos em artefatos tangíveis, prontos para serem testados e lançados no mercado com elementos visuais de bom gosto e experiências funcionais. E já emendo aqui um super artigo do Francesco Bertelli que fala sobre AI de uma maneira incrível, o texto dele está totalmente conectado ao nosso poder de visualização.
Mas então, porque tanta gente falando que UX morreu, Design perdeu importância, etc…? No meu ponto de vista esses títulos são clickbaits, o problema são as pessoas que divulgam essas idéias, porque geralmente, são eles os próprios culpados de toda essa “crise”. Podemos colocar esses personagens em duas categorias:
A primeira são aqueles que criam conteúdo no Linkedin, podcasts, etc… famosos que por anos surfaram na onda do "todo mundo é designer” e “visual não importa”, ou aqueles que adoram vender estratégia que vem sempre empacotado em um monte de teoria, em um monte de slides que deixaria qualquer designer envergonhado. Tem também o tal do guru, com um trabalho mediocre mas que fala suuuuuper bem em podcasts e vídeos, e de consequência se deu bem na carreira que criou em cima de vento. Incluindo colegas brasileiros, que por anos ficaram martelando a mesma idéia, e que hoje, felizmente, entenderam que não era bem assim e estão arrumando o curso das coisas. Esses líderes criadores, indiretamente formaram uma geração de designers que não sabe o real significado de ser um designer. Fulano “executivo de design“ que tem um site todo quebrado, sem o mínimo entendimento de um layout bem feito, mas que ainda se acha no direito de vender cursos e mentorias de design. Vejam bem, no mundo de hoje todo mundo pode vender algo e não tem nada de errado nisso, mas esses produtos confundem as pessoas, no caso acima, o máximo que ele pode ensinar é pesquisa, arquitetura de informação, mas certamente não design estratégico. É o problema do filtro, lembra que falamos sobre isso no passado?
A segunda são os líderes de design, que por causa da onda do UX conseguiram posições de liderança mas que também não sabem o que é design. Esse pessoal acabou fomentando uma geração inteira de “não sei o que estou fazendo” martelando sempre as mesmas mensagens. Foco em processos e metodologias, muitas vezes ignorando a importância do ofício, da criatividade e da intuição. Eles priorizaram frameworks, eficiência e escalabilidade, mas deixaram o verdadeiro coração do design de lado. À medida que esses líderes subiram na hierarquia, passaram adiante uma forma de trabalhar que transformou o design em um processo passo a passo, ensinando os designers a seguir regras em vez de pelo menos questioná-las. Isso criou um ciclo de mediocridade—designers fazendo o que era seguro, e não o que era ousado. As decisões passaram a ser sobre agradar a todos, não sobre fazer escolhas criativas e fortes. A liderança que deveria ter impulsionado o design acabou enfraquecendo a disciplina.
Abrindo mais a discussão, na última década, o design passou de uma skill guiada por intuição, arte e visionários para um campo dominado por frameworks, metodologias e decisões baseadas em dados, é evidente hoje que processos e métricas têm prioridade sobre o instinto criativo quando falamos de UX/UI. Mas essa “evolução” está realmente tornando o design melhor—ou apenas mais eficiente, ou nenhum dos dois? Se designers lendários como Massimo Vignelli, Milton Glaser, Paula Scher, David Carson, Oswaldo Miranda, Alexandre Wollner e outros… estivessem trabalhando com UX hoje, provavelmente questionariam a dependência excessiva da indústria em processos e defenderiam o retorno da intuição humana, da arte e da ousadia como verdadeiras forças por trás do design estratégico.
Quando design não era um checklist
Os grandes mestres do design acima, construíram suas carreiras com base em fortes convicções sobre estética, narrativa e comunicação. Vignelli defendia princípios tipográficos atemporais. Scher abraçou a espontaneidade e ousadia. Carson quebrava (e quebra) todas as regras imagináveis para criar experiências editoriais inovadoras. O trabalho deles era guiado por uma visão e uma compreensão profunda do design como um trabalho emocional, intelectual e de negócios.
Quando toda decisão de design precisa ser respaldada por dados e usuários, onde fica o espaço para a intuição? Onde há espaço para saltos criativos que não se encaixam perfeitamente em um painel de métricas? Embora esses processos garantam usabilidade e acessibilidade, muitas vezes eles tiram do design a capacidade de surpreender, desafiar e provocar. Eles tiram o papel estratégico do Design — métricas, benchmarking, A/B, Research… joga isso na mão do PM!! Vai fazer DESIGN! Use o que o PM vai te dar, não precisa ultrapassar a linha, o teu valor não está lá, está nos fundamentos da disciplina de Design! Se voce entender isso, a tua vida profissional vai ser mais prazeirosa e até mais fácil.
Cybertruck? Coisa horrível, mas ousado, provocador. Humane Pin? Sem sentido, mas foi uma exploração curiosa — Isso tudo é Design. Claro que não podemos esquecer o fato do business não gostar de riscos, e como o design é vítima do “copie o que está funcionando”, eu também entro nesse balaio todo, também tive que abraçar o mundo do produto e não romper padrões para não prejudicar o negócio, mas sempre procuro brechas, chances de fazer algo único, se não no trabalho faço como projeto pessoal, e sempre tento passar essa filosofia aos designers que tenho a honra de mentorar e gerenciar.
Mas a conversa hoje é mais espiritual do que operacional, então vou continuar no plano da poesia ok 🙂
O perigo do design por comitê
Os textos que foram publicados durante essas semanas passadas, falam que UX se tornou "sem cabeça". O campo está sobrecarregado por uma cultura excessivamente processual, onde as equipes de design perderam influência estratégica e frequentemente são reduzidas a funções executoras. NÃO… SÉRIO MESMO??!! Mas são eles, e uma outra cacetada de gente, que na fúria de “ensinar” as empresas que design devia fazer parte da estratégia, enfiando diamond process goela abaixo de todo mundo, fizeram justamente o oposto, ficaram conhecidos como — lá vem os chatos do design com toda a teoria e framework deles — . Vejam o site desse pessoal, são claramente arquitetos de informação, muito diferente de Designers, é por isso que acredito na separação das disciplinas.
A natureza colaborativa do UX moderno não é ruim por completo, mas muitas vezes leva à mediocridade orientada por consenso. Quando cada decisão de design precisa passar por camadas de aprovação, testes e validações de stakeholders, o resultado tende a ser previsível, seguro e pouco inspirador (também já passei por isso várias vezes). Os grandes mestres prosperaram com autonomia e convicção—qualidades cada vez mais raras no ambiente de UX.
Restaurando o equilíbrio
Nada disso significa que o processo não tem lugar no design. O melhor trabalho acontece quando estrutura e criatividade coexistem. Mas a indústria precisa reconhecer que frameworks e metodologias devem servir ao design, não controlá-lo.
Menos rigidez nos processos, mais espaço para riscos criativos.
Menos camadas de aprovação, mais liderança decisiva.
Dados como ponto de referência, não como regra absoluta.
Um retorno ao design guiado por emoção, intuição e convicção artística.
Mais espaço para o designer explorar sozinho, menos comitês.
O Design como um esforço humano
O grande design sempre foi mais do que um conjunto de melhores práticas—é uma arte, uma declaração, uma maneira de ver o mundo de forma diferente. Os mestres sabiam/sabem disso e, se quando projetam ou projetavam, provavelmente resistiriam a um sistema que valoriza mais a eficiência do que a originalidade.
Para que o design continue sendo estratégico, ele precisa recuperar sua essência humana. Intuição, narrativa e arte são o que tornam o design verdadeiramente transformador. Sem esses elementos, corremos o risco de transformar o design em nada mais do que uma linha de montagem de entregas otimizadas, sem inspiração.
Estava quase publicando esse texto quando vi esse artigo, uma breve “entrevista” com o fundador da Linear, muito interessante, veja como o que ele fala ali se encaixa com o vc está lendo aqui.
👉🏻 10 rules for crafting products that stand out
Também achei esse gráfico interessante
E finalmente os textos que mencionei acima
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The Design Edition tem materiais nos seguintes formatos:
🎧 The Design Edition podcast (2018 - 2021)
👨🏻💻 Casos Reais de Design (vídeos)
🏷️ Mapeamento de Carreira (Google Sheet)
Abraço e até a próxima
Al Lucca - vamos nos conectar lá no Linkedin
Colocação absurdamente precisa!
Acredito que a maioria dos UX hoje (eu incluso) temos que nos curvar a processos, camadas de validação e tarefas que dificilmente movem o Design pra frente, pelo contrário, atrasam nosso lado.
Eu advogo demais pela intuição, provocação e principalmente diversão durante a prática do Design, infelizmente o mercado de produto se tornou estéreo e com medo de ser criativo.
Excelente reflexão Al!
Adorei a parte que você fala "A natureza colaborativa do UX moderno não é ruim por completo, mas muitas vezes leva à mediocridade orientada por consenso.", porque isso é o reflexo de uma geração de designers criados com mamadeira de duplo diamante.
O Tobias van Schneider, na sua última newsletter, faz uma reflexão parecida com a sua junto com o avanço da IA, dizendo que aquele designer que faz design simples, sem diferencial, sem nenhuma razão de ser memorável, vai continuar fazendo isso, e o designer que evoluiu seu ofício só vai ficar cada vez melhor com as ferramentas de IA. No fim, qualidade nunca esteve no processo ou na ferramenta, mas na capacidade do designer de ser criativo e preocupado com a qualidade do seu ofício.